Montadora famosa de carros é denunciada por trabalho escravo
Montadora chinesa e duas empreiteiras são acusadas pelo Ministério Público do Trabalho de manter estrangeiros em condições análogas à escravidão durante a construção da fábrica em Camaçari; ação cobra R$ 257 milhões em indenizações
O Ministério Público do Trabalho na Bahia (MPT-BA) entrou com uma ação civil pública contra a montadora BYD, de origem chinesa, e duas empreiteiras que atuaram na construção da futura unidade da empresa em Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador.
O órgão acusa as empresas de submeterem 220 trabalhadores chineses a situações que violam os direitos humanos, incluindo trabalho forçado, tráfico de pessoas e condições degradantes de alojamento.
O processo foi protocolado na última terça-feira (27), e exige o pagamento de R$ 257 milhões por danos morais coletivos, além de compensações individuais.

Os trabalhadores foram encontrados em situação de vulnerabilidade em dezembro de 2024, durante uma ação conjunta com órgãos federais. As investigações revelam um esquema de entrada irregular no país e violação de contratos de trabalho.
Condições precárias e controle abusivo
Segundo a denúncia, os trabalhadores enfrentavam jornadas excessivas, sem folgas, e viviam em alojamentos sem condições mínimas de higiene ou conforto. Documentos pessoais, como passaportes, eram retidos, e seguranças armados impediam a livre circulação dos operários.
Em um dos alojamentos, 31 pessoas compartilhavam um único banheiro; em outros, havia camas improvisadas, sem colchão.
Relatos colhidos pelo MPT indicam que até 70% dos salários eram retidos. Quem tentasse deixar o emprego antes do prazo mínimo contratual era penalizado com multas contratuais, perda de valores retidos e a obrigatoriedade de arcar com os custos da passagem de retorno ao país de origem.
Essas práticas, segundo o MPT, configuram confisco salarial e caracterizam situação de submissão ilegal.
Entrada irregular e uso indevido de vistos
O grupo de trabalhadores ingressou no Brasil de forma incompatível com a legislação migratória. Os vistos emitidos estavam vinculados a atividades especializadas, mas as funções desempenhadas nos canteiros de obra não condiziam com o que foi autorizado.
O MPT também observou que os contratos impunham restrições abusivas aos trabalhadores e infringiam a legislação trabalhista brasileira.
As vítimas estavam divididas entre cinco alojamentos mantidos pelas empreiteiras JinJiang Construction e Tonghe Equipamentos Inteligentes (atualmente registrada como Tecmonta).
As condições identificadas nos locais motivaram o pedido de indenização individual correspondente a 21 vezes o salário mensal de cada empregado, estimado em R$ 4,7 mil, além de um adicional diário proporcional ao tempo em que permaneceram em situação degradante.
Desdobramentos judiciais e posicionamento da empresa
A ação tramita na Justiça do Trabalho, e as empresas envolvidas ainda poderão apresentar suas defesas formais. A BYD declarou, por meio de nota, que tem um “compromisso inegociável com os direitos humanos” e que vai se manifestar nos autos do processo.
Após a revelação do caso, a empresa rompeu contrato com a JinJiang e realocou parte dos operários em hotéis da região.
A fábrica da BYD em Camaçari está prevista para iniciar suas atividades em 2025, com uma produção anual estimada em 150 mil veículos.