Fim do Bolsa Família e fim do saque-aniversário tem mais semelhanças do que imagina
Nos últimos anos, os debates sobre políticas sociais e econômicas no Brasil têm gerado grande repercussão, especialmente em relação ao Bolsa Família e ao saque-aniversário do FGTS.
Embora sejam instrumentos diferentes, ambos têm sido alvo de discussões acaloradas, e sua extinção pode trazer impactos econômicos e sociais semelhantes, especialmente para as camadas mais vulneráveis da população.
A proposta de acabar com o saque-aniversário do FGTS, um benefício criado em 2020, e a constante preocupação sobre o futuro do Bolsa Família, que já passou por diversas reformulações, revelam pontos em comum que merecem análise cuidadosa.
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Impactos econômicos similares
O impacto do fim do saque-aniversário do FGTS, assim como o de um possível encerramento do Bolsa Família, é considerado por muitos especialistas como um golpe na economia nacional.
Segundo um estudo da Ecoa Consultoria Econômica, a cada R$ 1,00 destinado ao consumo por meio do saque-aniversário, o PIB brasileiro aumentava R$ 1,80, um efeito multiplicador muito próximo ao observado com o Bolsa Família, que apresentou um impacto de R$ 1,78 no PIB ao longo dos anos.
Apenas em 2023, o saque-aniversário injetou R$ 26,6 bilhões na economia, o que resultou na manutenção de aproximadamente 343 mil postos de trabalho. Para o Bolsa Família, a transferência de recursos também exerce um efeito multiplicador semelhante, estimulando o consumo e, consequentemente, a geração de empregos em setores essenciais, como o comércio e serviços.
Benefícios sociais e proteção aos vulneráveis
Ambas as modalidades visam proteger as camadas mais vulneráveis da população. O Bolsa Família, com suas parcelas mensais, oferece um alicerce importante para milhões de brasileiros em situação de pobreza e extrema pobreza.
O saque-aniversário, por sua vez, permite que trabalhadores de setores formais tenham acesso a uma parte do saldo do FGTS para suprir necessidades emergenciais, como gastos com saúde, educação e alimentação.
A extinção de qualquer um desses programas pode significar um aumento da vulnerabilidade econômica dessas pessoas. A pesquisa da Ecoa, encomendada pela ABBC e Zetta, aponta que o fim do saque-aniversário pode reduzir o acesso a crédito e recursos para até 130 milhões de brasileiros, representando uma enorme perda de proteção social.
Geração de emprego e aumento da arrecadação
Outro ponto de semelhança entre o fim do Bolsa Família e o fim do saque-aniversário do FGTS está na geração de empregos e na arrecadação de impostos. O estudo da Ecoa estima que, desde a implementação do saque-aniversário, o programa gerou um impacto de R$ 273,7 bilhões no PIB, com a criação de 3,5 milhões de postos de trabalho e R$ 28,7 bilhões em arrecadação de impostos.
O Bolsa Família, da mesma forma, tem sido um gerador indireto de empregos, especialmente no comércio de alimentos e bens de consumo. Sua extinção poderia significar uma desaceleração no crescimento desses setores.
Crítica ao novo modelo de Crédito Consignado
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) tem defendido a substituição do saque-aniversário por um novo modelo de crédito consignado, com taxas mais acessíveis.
No entanto, especialistas alertam que essa mudança pode não trazer os benefícios esperados, especialmente para os trabalhadores negativados, que representam 75% dos beneficiários do saque-aniversário, segundo pesquisa do Datafolha.
Com taxas de juros mais altas do que as do saque-aniversário (1,79% ao mês), o crédito consignado privado pode acabar sendo um peso adicional para aqueles que já enfrentam dificuldades financeiras.
Em vez de ajudar a melhorar a situação desses trabalhadores, o novo modelo pode exacerbar as desigualdades, atingindo ainda mais as pessoas em situação de inadimplência e comprometendo sua capacidade de acessar crédito acessível.
Outro ponto importante de comparação entre o fim do saque-aniversário e o Bolsa Família é a exclusão social que pode resultar dessas mudanças. De acordo com o MTE, a criação do crédito consignado com taxas acessíveis poderia beneficiar 70 milhões de trabalhadores registrados no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).
Contudo, uma análise mais profunda revela que esse novo modelo de crédito não seria capaz de atender aos 130 milhões de brasileiros que atualmente são beneficiados pelo saque-aniversário.
A perda de acesso a recursos diretos, seja pelo Bolsa Família ou pelo saque-aniversário, pode resultar em um aumento significativo da desigualdade social, prejudicando ainda mais as populações mais pobres e vulneráveis, que já enfrentam dificuldades para acessar serviços essenciais e garantir o mínimo de qualidade de vida.
Defesa pela sustentabilidade do FGTS
O governo federal argumenta que a extinção do saque-aniversário é necessária para preservar a sustentabilidade do FGTS, que financia programas de habitação popular, infraestrutura e saneamento.
Segundo o MTE, o saque-aniversário comprometeria a capacidade do fundo de continuar a financiar esses projetos de longo prazo, essenciais para o desenvolvimento social e econômico do Brasil.
Entretanto, críticas surgem em relação a essa análise. Especialistas afirmam que a extinção do saque-aniversário não resolveria os problemas de sustentabilidade do FGTS, pois a principal barreira ao acesso à habitação popular permanece inalterada.
Ou seja, trabalhadores negativados continuariam sem acesso a crédito, independentemente da existência ou não do saque-aniversário.
Afinal, quando se trata de programas sociais e benefícios trabalhistas, o equilíbrio entre a eficiência econômica e a justiça social é mais importante do que nunca.