Esse aplicativo para celular é extremamente perigoso e crianças estão usando
Nos bastidores da internet, o Discord se tornou ponto de atenção crescente para autoridades que investigam a propagação de discursos de ódio e a organização de crimes violentos.
Originalmente criado para unir comunidades de jogadores, o aplicativo tem servido como palco para ações coordenadas de grupos extremistas, com transmissões ao vivo de violência explícita e conteúdos ilegais que vêm se intensificando nos últimos anos.
Em uma das operações mais recentes, o Ciberlab — setor do Ministério da Justiça dedicado a crimes digitais — colaborou com a Polícia Civil do Rio de Janeiro para desarticular um grupo que planejava ataques a jovens e pessoas LGBTQIA+ durante o show da cantora Lady Gaga, na orla de Copacabana. A articulação foi feita, novamente, dentro de servidores privados no Discord.
“A gente assiste a horrores sendo tratados como diversão”, afirma o delegado Alesandro Barreto, coordenador do Ciberlab. Ele relata ter visto, por exemplo, uma cena em que um cachorro era maltratado e morto diante de mais de 200 espectadores online, que interagiam como se fosse uma partida de videogame.
Crescimento de denúncias e atuação limitada do Estado
Dados da ONG Safernet, referência na promoção dos direitos humanos na internet, mostram que o número de denúncias envolvendo o Discord cresceu 172,5% no primeiro trimestre de 2025 em comparação com o mesmo período do ano anterior. Os casos mais recorrentes envolvem apologia ao crime, homofobia e pornografia infantil.
Embora o Discord afirme colaborar com as autoridades e adotar uma política de “tolerância zero” a conteúdos ilegais, pesquisadores apontam que a estrutura da plataforma favorece a formação de comunidades fechadas e autorreguladas, o que dificulta a fiscalização.
Um ecossistema próprio para a radicalização
O Discord possui características únicas que o diferenciam de outras redes. A principal delas é o foco em servidores fechados, nos quais o conteúdo é criado para um público interno e não para viralizar — o que reduz o alcance de críticas ou visibilidade de denúncias externas.
Esses espaços restritos tornam o processo de moderação mais difícil e, em muitos casos, dependente apenas dos próprios administradores dos grupos.
O ambiente fechado também contribui para o que os usuários chamam de “lulz” — uma gíria derivada de “LOL” (laughing out loud), usada para descrever prazer sádico em atos cruéis, frequentemente compartilhados ao vivo entre os membros.
Autoridades pedem providências
O avanço desses conteúdos no Discord levou o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) a solicitar ao Ministério Público Federal a suspensão da plataforma no Brasil. A iniciativa reacendeu o debate sobre os limites da liberdade de expressão nas redes e a responsabilidade das empresas de tecnologia na moderação de seus espaços.
Em nota enviada à imprensa, o Discord alegou que vem reforçando sua atuação no Brasil, com equipes especializadas na remoção de conteúdos nocivos locais e parcerias com autoridades policiais.
No entanto, a empresa não respondeu sobre o armazenamento das transmissões ao vivo, que costumam desaparecer logo após o encerramento — o que compromete a coleta de provas.