Golpistas estão usando selfies de aposentados para aplicar golpe

Imagens públicas postadas em redes sociais ou vazadas de bancos de dados estão sendo utilizadas por criminosos para contratar empréstimos consignados em nome de aposentados e pensionistas do INSS, sem o consentimento dos titulares.

A prática tem gerado ações judiciais em diferentes estados e acendeu o alerta para falhas nos sistemas de validação digital.

A situação levou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a adotar uma nova medida de segurança: a partir de 23 de maio, a biometria facial com prova de vivacidade será obrigatória para desbloquear o benefício e liberar novos contratos de crédito.

A decisão ocorre após o bloqueio temporário dos consignados, anunciado neste mês, diante do aumento das denúncias de contratações indevidas.

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Crescimento das fraudes e medidas do INSS

Segundo especialistas em direito digital e cibersegurança, os golpes com uso de imagens faciais se intensificaram durante a pandemia da Covid-19, período em que houve maior digitalização dos serviços públicos e bancários.

Embora a assinatura digital por reconhecimento facial esteja prevista na legislação brasileira como forma válida de autenticação, ela só é considerada segura quando inclui a verificação de que a imagem foi feita em tempo real — processo conhecido como “liveness detection”. Em muitos dos casos investigados, essa etapa foi ignorada.

Relatórios do próprio governo apontam falhas no controle do sistema de consignações. De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), o volume de empréstimos consignados com desconto direto na folha saltou de R$ 57,5 bilhões em 2021 para R$ 89,2 bilhões em 2023.

Como o golpe acontece

Criminosos abordam as vítimas, geralmente idosos, com propostas enganosas: revisão de aposentadoria, liberação de valores retidos ou cadastro em programas sociais. Em seguida, coletam uma imagem do rosto, que será usada para validar digitalmente um contrato de empréstimo — muitas vezes sem que a pessoa perceba.

“Um dos golpes mais comuns é feito em lojas, onde o idoso é fotografado durante uma suposta simulação. Mais tarde, essa imagem serve para autorizar um contrato consignado”, explica Mauricio Cesar Cetrangolo, perito da OAB-RJ.

Em outros casos, os fraudadores sequer abordam diretamente as vítimas. Simples fotos públicas de redes sociais são suficientes para burlar sistemas que não exigem prova de vivacidade.

“A pessoa nem sabe que a imagem foi usada, mas o sistema aprova por não checar se foi feita em tempo real”, diz Petterson Faria, do Instituto de Defesa Cibernética.

Justiça tem reconhecido fraudes

Os golpes chegaram aos tribunais. Em Goiás, uma aposentada foi induzida por telefone a acreditar que receberia uma restituição de valores. Acabou contratando, sem saber, um empréstimo de R$ 6,2 mil. O banco foi condenado a restituir o valor e pagar R$ 10 mil por danos morais.

No estado de São Paulo, outra aposentada, analfabeta, teve descontos feitos com base em um contrato assinado via selfie. A Justiça ordenou o reembolso integral dos valores cobrados indevidamente.

Casos semelhantes vêm se repetindo pelo país, com decisões favoráveis às vítimas, principalmente quando se comprova a ausência de consentimento válido ou a condição de vulnerabilidade do consumidor.

Advogados e especialistas apontam falhas no sistema

A advogada Lays Ansanelli, especialista em direito bancário, afirma que, com o aumento das transações digitais durante a pandemia, o uso de selfies como assinatura eletrônica passou a ser mais explorado pelos golpistas.

Já identificamos o mesmo rosto em dois contratos diferentes, com bancos distintos”, revela a profissional em entrevista ao jornal O Globo.

Ela alerta que dados pessoais e imagens coletadas legitimamente em contratos anteriores podem ser reutilizados indevidamente, sem que o cliente saiba.

Além da imagem, golpistas também acessam dados complementares, como CPF e número do benefício. Sites falsos, muitas vezes com aparência institucional, são usados para simular cadastros e capturar essas informações.

“É essencial que o cidadão verifique se está em um site com conexão segura, que comece com ‘https’, e se há certificação de segurança reconhecida pelo Banco Central”, orienta Marcelina Liberato, vice-presidente da Ordem dos Peritos do Brasil.

Recomendações de segurança

Especialistas em cibersegurança recomendam que o cidadão nunca permita fotos ou vídeos de seu rosto fora de ambientes oficiais, como aplicativos de bancos ou agências autorizadas. A biometria facial, quando realizada corretamente, é uma tecnologia segura, com margem de erro inferior a 1%, segundo a Serasa Experian.

Enquanto o sistema de crédito consignado segue em expansão, cresce também a necessidade de proteção digital mais eficaz, especialmente para idosos e pensionistas, que continuam entre os alvos preferenciais de golpes sofisticados.

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